quinta-feira, dezembro 14, 2006

Se... Rudyard Kipling

Há umas semanas atrás, em plena "crise dos comentários", uma leitora enviou-me uma versão portuguesa do poema "IF" de Rudyard Kipling, em jeito de agradecimento pela minha postura na gestão dessa crise, modéstia à parte.
O poema "Se..." é um dos poemas da minha vida. Há muitas traduções deste poema em português, mas a que mais gosto, especialmente quando declamada por João Villaret é a versão, abaixo postada. Eis o poema, que partilho convosco:

SE...

Se podes conservar o bom senso e a calma
Num mundo a delirar, para quem o louco és tu.
Se podes crer em ti com toda a força da alma
Quando ninguém te crê. Se vais faminto e nu
Trilhando sem revolta um rumo solitário.
Se à torpe intolerância, se à negra incompreensão,
Tu podes responder subindo o teu calvário
Com lágrimas de amor e bênçãos de perdão.
Se podes dizer bem de quem te calunia,
Se dás ternura em troca aos que te dão rancor
Mas sem a afectação de um santo que oficia,
Nem pretensões de sábio a dar lições de amor.
Se podes esperar sem fatigar a esperança,
Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho,
Fazer do pensamento um arco de aliança
Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho.
Se podes encarar com indiferença igual
O triunfo e a derrota, eternos impostores!
Se podes ver o bem oculto em todo o mal
E resignar sorrindo ao amor dos teus amores.
Se podes resistir à raiva e à vergonha
De ver envenenar as frases que disseste
E que um velhaco emprega eivadas de peçonha
Com falsas intenções que tu!... jamais lhe deste!
Se podes ver por terra as obras que fizeste,
Vaiadas por malsins, desorientando o povo,
E sem dizeres palavra e sem um termo agreste
Voltares ao princípio para construir de novo.
Se puderes obrigar o coração e os músculos
A renovar um esforço há muito vacilante,
Quando no teu corpo já afogado em crepúsculos
Só exista a vontade a comandar – Avante!
Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre,
Se vivendo entre os reis conservas a humildade
Se inimigo ou amigo, poderoso ou pobre,
São iguais para ti à luz da eternidade.
Se quem conta contigo encontra mais que a conta,
Se podes empregar os sessenta segundos
De cada minuto que passa em obra de tal monta
Que o minuto se espraia em séculos fecundos.
Então, ao ser sublime o mundo inteiro é teu!
Já dominaste os reis, os templos, os espaços,
Mas ainda para além um novo sol rompeu
Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos.
Pairando numa esfera acima deste plano
Sem recear jamais que os erros te retomem,
Quando já nada houver em ti que seja humano,
Alegra-te meu filho... Então serás um HOMEM!
Joseph Rudyard Kipling nasceu em Bombaim em 30 de Dezembro de 1865 e morreu en Inglaterra a 18 de Janeiro de 1936. Foi educado na Universidade United Services em Westward Ho!, na Inglaterra, que lhe proporcionou o cenário para Stalky and Co. (1899); trabalhou como jornalista na Índia, entre 1882 e 1889, escrevendo, ao longo destes anos, Plain Tales from the Hills, Soldiers Three (1890), Wee Willie Winkie (1890), e outras obras. Regressado a Londres, publicou The Light that Failed (1890) e Barrack-Room Ballads (1892), altura em que foi viver para os EUA, onde ficou até 1896; aí elaborou os dois Livros da Selva e Captains Courageous (1897).
Instalado no Sussex, no sudoeste de Inglaterra, publicou Kim, cuja acção decorre na Índia, Just So Stories, Puck of Pook’s Hill e Rewards and Fairies (1910).
Para a popularidade de Kipling contribuíram os poemas Danny Deever, Gunga Din e If, que expressam uma empatia com a experiência comum, em conjunto com um sentido intenso da «Englishness», por vezes denegrida como um género de imperialismo jingoísta.
Recebeu o Prémio Nobel da Literatura, em 1907, e a sua obra tem sido cada vez mais valorizada devido à complexidade da caracterização e aos subtis pontos de vista morais.

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