sábado, abril 01, 2006

Das Palavras ao Acto


Uma das maiores conquistas pessoais a que qualquer ser humano aspira é ser bem sucedido quando tenta perceber as razões porque está insatisfeito, no fundo uma pequena parte do processo que Sócrates imortalizou com a frase “Conhece-te a ti mesmo”. Um sentimento indefinido, uma emoção mal explicada ou incompreendida pode dar lugar a momentos de desorientação significativos, a maior parte das vezes não pela dimensão, mas pela incapacidade de verbalizar o que nos vai na alma, sobretudo porque esta é uma limitação teima em não nos abandonar.
A maior parte destas insatisfações surgem no nosso quotidiano, que nos torna obsessivos e, por mais que nos queiramos afastar dos nossos problemas, a maior parte das vezes as tentativas revelam-se infrutíferas. Eles gravitam em torno do nosso pensamento e afloram permanentemente. Os subterfúgios a que recorremos para nos libertarmos desta espécie de grilhões, consequências das obsessões, e que são obviamente idiossincráticas, assumem-se como actos de fuga à angústia gerada que subjuga a nossa vontade. Alguns tentam ocupar o cérebro lendo, viajando, com música, com indo ao cinema ou então a escrever em exercícios de catarse.
Assim, as palavras, quando bem escritas, entre outras coisas, enriquecem-nos a alma, ao trazerem alguma ordem ao tumulto interior que é vulgar existir durante a nossa busca pela maturidade. Conseguem dar um nexo a algumas sensações que estão presentes na nossa mente de forma incoerente, quando revelam algo que não fomos capazes de organizar num pensamento lógico e que traduz aquilo que sempre quisemos dizer.
Os filmes, em certa medida, também têm este efeito uma vez que, apesar do deslumbramento visual substituir a imaginação que, individualmente, fazemos nascer das palavras, um bom argumento também o faz. (A imaginação do ser humano é revelada aqui, nos livros e nos filmes, em doses elevadíssimas. É no acto imaginar que reside a esperança no futuro da humanidade).
A música, por outro lado, é o deleite, uma forma de arte que consegue eliminar qualquer tipo de solidão. A espantosa harmonia que alguns seres humanos conceberam ao juntar um conjunto de sons numa sequência melódica a partir de uma algo imaterial é, de facto, assombrosa. Já viajar é um acto de libertação. A descoberta de lugares desconhecidos, a procura do diferente e do contínuo deslumbramento com as coisas do mundo.
No entanto, após tantas páginas lidas, tantos filmes visionados, tantos quilómetros percorridos e um sem número de outras coisas feitas, há dias em que a insatisfação se mantém. O nível de abstracção conseguido em cada uma destas acções é limitado, sabida que é a facilidade com que estabelecem paralelismos entre o que lemos, vemos e ouvimos e os nossos próprios problemas.
Perante isto, apenas uma distracção que com laivos de irracionalidade pode funcionar como escape. Algo que seja tão obsessivo que se sobreponha a tudo o resto, tornando-se ela própria a obsessão dominante, sem induzir depressões, e que consiga fazer esquecer completamente a insatisfação que nos aflige.
Estou a falar de sexo, não é à toa que os franceses, chamam ao orgasmo "la petit mort".
São duas da manhã, vou tentar ter a minha "pequena ressurreição".
Até amanhã!
Filipe Pinto

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